SOU AQUILO QUE TENHO???
Essa conversa de vivermos na era em que o "ter" é mais importante do que "ser", ou que "eu sou o que tenho", é velha. Mas mesmo eu que me considero uma pessoa esclarecida vivi isto na pele há poucos dias.
No natal eu e minha irmã decidimos, queríamos um DVD. Fizemos um acordo com a mãe. Neste natal a família se dará um único presente, o bendito do DVD. Bom, passou o natal, o dinheiro como sempre não veio e o DVD, por conseguinte, também não. Ficou assim, um natal sem presentes.
Mais de meio ano depois, mais precisamente em 29/07/2005, no meu aniversário, eu voltei à questão: quero o tal do DVD. Fiz um segundo acordo com a mãe: este DVD será meu presente de 15 anos (não ganhei nada na época, ficaram me devendo uma viagem pra Disney, mas a única coisa que vai para longe de casa ultimamente é o nosso dinheiro), natal (aquele que era para ser o DVD o presente) e do presente aniversário.
A par das sempre presentes dificuldades financeiras, eu mesmo assumi o ônus financeiro do meu presente (emprestei para minha família o dinheiro do meu presente), ficaram de me pagar um dia. Foi um tremendo esforço, duas semanas procurando preços baixos e promoções de maneira frenética. Nesse meio tempo, descubro que a minha TV é tão velha, que não possuí entrada de áudio e vídeo, eu teria que comprar um “adaptador”. Pesquisa pra lá, pesquisa pra cá, até que me decidi. Comprei o mais baratinho, nada com nada, sem a tal telinha de “sei lá o que”, portátil: R$ 299,00 pedalados em 6 vezes sem juros. Fui à Digimer e comprei o tal do conversor (mais um graninha indo).
Neste momento, mesmo depois de gasto uma fortuna, eu não cabia em mim de felicidade. Eis que nervoso e angustiado chego em casa para a estréia do DVD. Bom, maior não poderia ser a catástrofe. A porcaria não funcionou. Contatos para lá e para cá, descubro o seguinte: o adaptador é ruim, não funciona, e mesmo que funcionasse, a minha TV é tão velha que não possuí os modos de sintonia necessários. Fiquei arrasado, triste mesmo.
Mas eu sou forte, nunca me entreguei a depressão. Não deixaria um mero DVD estragar minha vida. Passado um tempo comecei a refletir. Olha tudo que eu fiz, toda a emoção envolvida na compra de um objeto. Uma simples “coisa”. Eu estava me sentindo mal por não ter um DVD, isso era fato, e fiquei assustado. Perguntei-me se eu sou o que tenho, minha resposta lógica foi dizer NÃO. Mas e minha resposta prática? Bom, eu já até escolhi a TV nova.
[1:12 AM] [Lucas Gutierrez] [
link] [ ]


Pessoas "esclarecidas" se inserem na sociedade de consumo tão bem ou melhor do que os chamados 'não esclarecidos'. (acho uma boa idéia discutir este concveito de 'esclarecimento') A ideologia que encobre o imperativo do consumo e faz com que as mercadorias assumam formas pessoais enquanto as pessoas se coisificam é presente, civilizatória e até dá dor de barriga.
Não ter o que a gente quer é ruim demais. O que não pode acontecer é deixar que as coisas nos escravizem.
Boa resposta a sua pra pergunta (auto-questionamento)...
Abraços!
Olha Lucas...se dependesse do meu auto-questionamento...eu estaria bem. Mas não foi o suficiente. Interpéries me atrapalharam...
Abraços!
Lucas, o que você questionou é a mais pura verdade, a nossa sociedade consumeirista acaba por nos escravizar à tecnologia, nos importar desejos que visem a satisfação pessoal e aí, se não paramos para refletir e perceber que não somos o que temos mas que o que temos se justifica pelos nossos esforços, ficamos submissos a nosso mundo capitalista e desigual. E pior é quando a frustação não permite que a pessoa tome outros rumos e deixe de lado aquilo que não deu certo ou que acarretaria um esforço muito maior, pois na verdade, tem pessoas que deixam até de prover sustento para seus filhos a fim de comprar cigarro e coisas derivadas e adjacentes. Parece brincadeira, mas fazendo SAJUG vi muito disso. Beijossss
Acho que o pior de tudo é que a nossa cultura nos leva a ser assim. Associar felicidade e dignidade a "ter" e não a "ser" é o primeiro passo para um colapso social. Capitalismo não é? A economia tem que girar, o capital tem que circular, as pessoas têm que comprar. Para isso funcionar é preciso imbutir necessidades, desejos e afins, e isso se faz através da cultura que é passada às pessoas.